Hidrogênio Verde – O Piauí quer o mundo

 Hidrogênio Verde – O Piauí quer o mundo

Por Henrique Rodrigues, jornalista, na Forum

De Lisboa – O futuro é da energia limpa e por isso o auditório do imponente Tivoli Hotel Lisboa, na capital portuguesa, estava lotado com mais de uma centena de pessoas, entre autoridades de vários países, empresários e acadêmicos, na manhã da última quinta-feira (6). Ali era realizado o Summit Piauí-Europa de Hidrogênio Verde, idealizado e capitaneado presencialmente pelo jovem governador piauiense Rafael Fonteles (PT), de 37 anos, que é professor e empreendedor, além de ter ocupado na gestão de seu antecessor, Wellington Dias (PT), o cargo de secretário da Fazenda.

“O nosso plano de governo tem tudo a ver com Portugal, tem tudo a ver com a Estônia, porque tem tudo a ver com transformação digital e com um governo digital, ecossistema de inovação, fomento de startups, a economia verde e a transição energética, que é o motivo dessa nossa agenda aqui. Eu tenho certeza que essa é uma pauta prioritária de Portugal e da Europa, e nós temos todos esses potenciais que foram mostrados aqui, e de forma crível, pelo professor Jesse, que eu agradeço por essa explanação tão objetiva, clara, didática e fundamentada, que só reforça o motivo pelo qual nós acreditamos que o Piauí é o melhor local, pelo menos nas Américas, para essa opção do hidrogênio verde, que nós sabemos que será o combustível do futuro, substituindo os combustíveis fósseis em diversas atividades”, começou dizendo o governador para uma plateia heterogênea que tinha à sua disposição um sistema de tradução simultânea.

FOTO: REPRODUÇÃOGovernador do Piauí, Rafael Fonteles, fala para o público no Summit Piauí-Europa Hidrogênio Verde

Governador do Piauí, Rafael Fonteles, fala para o público no Summit Piauí-Europa Hidrogênio Verde

O hidrogênio verde, para quem não conhece, é a maneira mais limpa de se obter o hidrogênio, um combustível universal que é gerado a partir de um processo chamado eletrólise. Na hora de se realizar esse processo químico, se a eletricidade empregada para a eletrólise foi de origem poluente, como por exemplo oriunda da queima de combustíveis fósseis, o processo não é considerado “verde”, pois emitiu poluentes. No caso deste exemplo mencionado, teríamos o chamado “hidrogênio cinza”. O “verde” é aquele cuja energia empregada veio de fonte limpa e sem qualquer tipo de emissão, ou ainda, emissões mínimas.

O Piauí, com sua natureza exuberante e com todos os fatores necessários para uma grande geração de hidrogênio verde disponíveis em seu meio ambiente, quer se tornar uma referência nas Américas, e quiçá no mundo, nesse ramo. Foi por isso que a conferência realizada em Lisboa e a inauguração de um escritório na principal cidade lusa atraiu tanta atenção dos europeus.

Para demonstrar a vocação inequívoca do estado nordestino para a geração de hidrogênio verde, o Summit Piauí-Europa contou com a palestra de um dos maiores especialistas do planeta no assunto, o professor brasileiro Jesse Van Griensven, titular da Universidade de Waterloo, no Canadá, que por videoconferência apresentou os dados técnicos mais atualizados e certificados que garantem a viabilidade do ambicioso projeto piauiense.

FOTO: REPRODUÇÃOPalestra com o professor Jesse Van Griensven, titular da Universidade de Waterloo, no Summit Piauí-Europa Hidrogênio Verde

Palestra com o professor Jesse Van Griensven, titular da Universidade de Waterloo, no Summit Piauí-Europa Hidrogênio Verde

Como prova do empenho do governo estadual nessa empreitada, o governador Rafael Fonteles disse aos interlocutores estrangeiros e brasileiros que, desde já, vem voltando todas as atenções para o projeto do hidrogênio verde e que isso engloba sobretudo o conhecimento científico, ressaltando também a importância da digitalização da sociedade para o futuro, tema que o levou à Estônia dias antes de desembarcar em Portugal, já que a pequena nação báltica é uma referência nessa transição.

“Todas as nossas bolsas de pesquisas nós estamos canalizando pra isso, para a transição energética e para a transição digital e estamos procurando parcerias com universidades europeias e universidades norte-americanas, exatamente para garantir todas as condições para que essas vantagens se materializem na produção do hidrogênio verde”, afirmou o governante.

Explicando aos convidados as inúmeras vantagens que o Piauí tem para encabeçar a produção de hidrogênio verde, Fonteles usou como exemplo o que era dito há mais de duas décadas sobre as energias eólica e solar, hoje uma realidade em toda a Terra e fortemente explorada nos estados nordestinos.

“Esse projeto, o “Hidrogênio Verde Piauí”, é um grande marco da energia limpa no Brasil e no mundo. E percebam como a transição acontece muito rapidamente: há 20 anos, eu estava no colégio, no Ensino Médio, e falava-se muito da energia eólica e da energia solar iriam vingar de vez, que iriam ser geradoras de oportunidades de trabalho, geradoras de riquezas para nosso estado, e em menos de 20 anos essa transição aconteceu na produção de energia eólica e de energia solar. Agora, o que a gente nota é que esse ciclo se repetirá, e numa velocidade maior ainda, em relação ao hidrogênio verde, mas que na verdade é uma continuidade. Vale lembrar que o hidrogênio não é uma nova forma de energia, ela é uma forma de estocar a energia limpa produzidas pelos painéis solares e pelas turbinas eólicas, é uma maneira de você armazenar essa energia para usá-la nas devidas atividades industriais, como em empresas de grande porte, em mobilidade, fabricação de fertilizantes, em qualquer atividade industrial que usa muita energia”, argumentou o chefe do Executivo do Piauí.

FOTO: REPRODUÇÃOGovernador do Piauí, Rafael Fonteles, fala para o público no Summit Piauí-Europa Hidrogênio Verde

Governador do Piauí, Rafael Fonteles, fala para o público no Summit Piauí-Europa Hidrogênio Verde

O hidrogênio verde ainda é considerado caro, com um valor aproximado de produção que fica entre 6 e 5 dólares por quilo, mas com uma perspectiva de que o preço se reduza para 2 dólares (ou menos) o quilo até o fim desta década. É aí que um plano bem elaborado e eficiente por parte do governo piauiense pode garantir que o estado em pouco tempo seja um dos maiores geradores no mundo, o que traria uma verdadeira revolução econômica.

“Nós estamos aqui para mostrar isso, para mostrar à comunidade europeia. Não é à toa que nós estamos lançando nosso escritório, o escritório do estado do Piauí aqui em Lisboa, hoje mesmo, assim como já lançamos na Estônia, que é justamente para poder aumentar esse intercâmbio Piauí-Europa, porque precisamos reconhecer que é a Europa que lidera esse tema no mundo, é quem está mais avançado nesses propósitos de transição energética, e o Brasil é um dos países que mais preserva o seu meio ambiente, que tem mais potencial na economia verde, e com o presidente Lula voltou a ser prioridade do governo federal a sustentabilidade ambiental e a transição energética. E esse é um ponto importante, porque ajuda todos a perceber o alinhamento não só do nosso governo estadual, mas também do governo federal na priorização dessa matéria”, completou Fonteles.

Quem compareceu ao evento e falou também com a reportagem da Fórum foi o embaixador do Brasil em Portugal, Raimundo Carreiro Silva. O diplomata preferiu falar de todos os estados nordestinos e mostrar como outras unidades federativas daquela região vêm se destacando no setor de energia limpa.

“Agora, neste momento, nós falamos do destaque do Piauí, mas vamos destacar os nove estados do Nordeste brasileiro. No caso do Rio Grande do Norte, por exemplo, a governadora Fátima Bezerra (PT) esteve aqui recentemente e sabe-se que lá já há também um plano bastante avançado nessa área do hidrogênio verde. Já no caso do estado do Ceará, lá no porto de Pecém, onde foi instalada a primeira célula de hidrogênio verde, será de lá certamente que partirão as exportações desse combustível do Brasil para a Europa. O fato é que nós já temos um grande desenvolvimento na área de energia eólica e de energia solar e agora o Piauí é quem se destaca mostrando seu papel importante nessa transição energética, sobretudo no setor do hidrogênio verde”, ressaltou o embaixador.

FOTO: REPRODUÇÃOEmbaixador do Brasil em Portugal, Raimundo Carreiro Silva (à esquerda), conversa com o governador Rafael Fonteles

Embaixador do Brasil em Portugal, Raimundo Carreiro Silva (à esquerda), conversa com o governador Rafael Fonteles

Entrevista à Fórum

Rafael Fonteles falou com exclusividade à reportagem da Fórum no Tivoli Hotel Lisboa. O governador explicou como vê o percurso a ser trilhado para que o Piauí converta-se numa potência no ramo do hidrogênio verde, mas preferiu fazer uma explanação mais ampla sobre os desafios econômicos de seu estado, que passa pelo fortalecimento de outras áreas geradoras de emprego, renda e riqueza.

“Nós ao chegarmos ao governo tínhamos muito claro os objetivos e os caminhos a percorrer, então nós temos quatro vetores muito claros de desenvolvimento para o nosso estado. E eles passam pela questão da agropecuária, tanto a agricultura familiar como o agronegócio, afinal é uma vocação do estado do Piauí, rico em terras, água e em boas condições de precipitação, portanto é uma vocação natural e nós pretendemos dar um passo no sentido da industrialização e não permanecermos sendo apenas um produtor de grãos, procurando também fortalecer o uso de tecnologias nessa área também para os pequenos produtores. Um outro vetor é a questão do turismo, que é um problema do Brasil. É impressionante como aqui (Europa), um monumento tem mais visitantes que os 5.565 municípios do nosso país. Só para se ter uma ideia, a Torre Eiffel tem mais turistas estrangeiros do que o Brasil inteiro. E essa é uma indústria que gera emprego e renda, porque ela gera emprego, é intensiva em mão de obra, e você tem vários outros setores econômicos que geram PIB, mas não geram riquezas para as pessoas. Esse viés é importante para a gente e essa visita à Europa também tratou disso, claro que não como um ponto focal, mas certamente teremos outras agendas aqui na Europa para tratar especificamente disso. Há também a questão da transição digital e até por isso eu fiz questão de ir também à Estônia, antes de vir a Portugal, que é um país pequeno mais referência em governo digital e sociedade digital, além de apoio às startups. Aqui em Portugal também está ocorrendo uma onda muito boa de digitalização da economia e a realização de grandes feiras, como a Web Summit, que é referência para o mundo. E o ponto principal, além disso tudo, que justifica nossa visita aqui, é a economia verde, especialmente o tema da energia limpa, que nós já somos referência, como você pode ver no evento ontem (Piauí Summit Hidrogênio Verde Europa), tanto em energia solar, como em energia eólica. E também em hidrelétricas, já que nossa matriz energética é totalmente limpa, não tem combustível fóssil. Nós produzimos mais de quatro vezes nossa energia consumida, e agora queremos estar à frente, na vanguarda do hidrogênio verde, que demonstra aqui na Europa como ele é o combustível do futuro. Na verdade, o hidrogênio nem é mais uma forma de energia, mas sim uma forma de estocar a energia. E sabemos que foi acelerada essa transição em termos de energia por conta da guerra da Ucrânia com a Rússia, como a Europa querendo ficar cada vez mais independente do gás russo, isso sem falar da questão ambiental. E nós temos a convicção que o Piauí tem as melhores condições naturais e institucionais para sermos inicialmente o maior polo de hidrogênio verde da América do Sul, e já estamos demonstrando isso”, disse.

Sobre a área do hidrogênio verde especificamente, Fonteles lembrou que outros estados brasileiros, sobretudo do Nordeste, já realizaram algumas experiências, mas que nada se aproxima do projeto do Piauí. Para colocar o plano em marcha, lembrou o político, é necessária a participação especialmente das universidades e do mundo acadêmico, vistos os desafios científicos para lidar com a transição energética.

“Nós temos uma pequena experiência no Ceará e uma pequena experiência na Bahia, mas nós acreditamos que o nosso modelo, e claro que esse seria o modelo do Nordeste inteiro, é o modelo mais completo. Mas nós não sabemos ainda qual será o principal uso desse hidrogênio, se será para a indústria de fertilizantes, se será para a indústria siderúrgica, se vai ser para o transporte. Então nós vamos em duas etapas: a energia solar e a energia eólica, que já é uma realidade no Nordeste do Brasil, e então queremos conectar isso a uma planta de eletrólise de água para gerar o hidrogênio. Bem, com isso, num primeiro momento, eu resolvo a questão do hidrogênio verde, e não o do hidrogênio cinza, que vem da fonte fóssil. Já a outra etapa é o uso desse hidrogênio. Eu vou usá-lo para quê? E é isso que todo mundo tá se perguntando, discutindo. É para transportar para a Alemanha, que fez um leilão do tipo nos últimos tempos? É para o consumo interno para a indústria de fertilizantes ou siderúrgica? Para aço verde, ou para etanol, aproveitando a própria biomassa que não é aproveitada na produção de grãos? Então, tem vários caminhos e nós estamos justamente aqui para ver todas essas direções, falando com todos os players possíveis, celebrando cinco memorandos de entendimento, celebramos acordos com mais de 30 instituições, celebramos quatro parcerias com universidades de Portugal, a Universidade de Lisboa, a Universidade Nova de Lisboa, a Universidade do Algarve e a Universidade de Évora buscando justamente estar na fronteira do conhecimento e da discussão econômica do aproveitamento do hidrogênio. Eu acredito, pelas conversas que tivemos aqui, logo após o evento ou individualmente com as empresas, que nós já nos tornamos uma referência e que será possivelmente, a do Piauí, a primeira planta em grande escala de hidrogênio verde do Brasil”, acrescentou o petista.

Fonteles também foi questionado sobre a recepção por parte de autoridades internacionais, já que o Brasil acaba de sair de quatro anos de um governo (de Jair Bolsonaro) que se orgulhava publicamente, segundo palavras do próprio ex-chanceler Ernesto Araújo, de ser “um pária internacional”. Assim como outros governadores e ministros de estado, o governante piauiense não titubeou em falar da diferença no tratamento agora que Lula voltou à Presidência.

“Sem dúvidas. A gente percebe essa abertura muito maior para nos escutar. Obviamente essa é a agenda de um estado, não de um país, mas a gente já percebe o interesse maior da comunidade europeia, e olha que nós experimentamos duas realidades bem diferentes, a leste e a oeste da Europa, e em ambos os lugares a recepção foi muito boa e com muita atenção por parte de nossos interlocutores, e essa é uma agenda que tem a ver com a agenda do presidente Lula e que tem a ver com a agenda da Europa. Eu acho e observo que o Brasil voltou e voltou com muita força. Há essa percepção de que o Brasil tem as melhores condições para o hidrogênio verde, por exemplo. A gente percebeu isso diretamente aqui conversando com vários players alemães, espanhóis, holandeses, com quem nós tratamos aqui. E são players grandes desse mercado, então a gente vê isso de forma muito evidente e percebo, sim, uma abertura muito maior, uma vontade maior de fazer, de estabelecer essas relações bilaterais, comerciais, econômicas, em função da retomada dessa agenda da economia verde do presidente Lula. Eu cheguei a vir com o governador Wellington (Dias, seu antecessor) algumas vezes aqui quando em âmbito federal nós tínhamos outro governo e a percepção que tínhamos é que nos olhávamos como se ficássemos de descaso, como se nossa agenda não fosse essa da Europa e dos outros países. Agora o Brasil está na agenda da Europa, e como nós temos potenciais todo esse interesse aumenta”, relatou o governador.

No plano interno, o jovem professor que assumiu o cargo anteriormente ocupado pelo agora senador Wellington Dias (PT) foi mais longe e explicitou a sensação de quem vive o atual momento, com Lula, e vivenciou os quatro anos de Jair Bolsonaro (PL), quando sequer os ritos republicanos e federativos mais básicos eram respeitados e a perseguição a governadores de partidos de oposição era explícita.

“Internamente eu destaco a volta do diálogo interfederativo e isso é mais do que evidente. E o presidente Lula faz isso de uma maneira muito republicana. Para se ter uma ideia, no governo anterior, nós do estado do Piauí sofremos muito com atitudes concretas de barrar recursos. Muitas vezes recursos já empenhados, recursos já usados para contratar, com crédito, e tivemos que recorrer ao Supremo Tribunal Federal várias vezes, e foi feita justiça. Aliás, eu quero registrar o papel importante da Suprema Corte brasileira na manutenção da democracia no país. Se tem uma coisa que ficou evidente, apesar do susto que tomamos, foi o fortalecimento das nossas instituições, da nossa democracia, que sofreu um grande susto, mas que se mostrou resistente. E olha que falamos de um país que flerta sempre com o autoritarismo, e olha que nós estamos no nosso maior período democrático na História, e nós temos que celebrar isso, apesar dos desafios, como esse Brasil que está muito polarizado, o que é muito ruim, porque termina trazendo a agenda sempre para o curto prazo, e nós sempre temos que olhar para o longo prazo, uma vez que ao você ficar dando margem para discutir essa polarização, você impede a gente de tocar a agenda. Eu venho dizendo isso: nós temos cada vez mais que tocar nossa agenda. Claro, temos que denunciar algo sempre que houver fatos evidentes de uma má utilização dos recursos públicos, ou do abuso do poder, mas não podemos esquecer de tocarmos nossa agenda. Internamente, em resumo, é isso: uma melhora no diálogo interfederativo e um esforço muito grande para retomar os programas sociais básicos, como merenda escolar ser reajustada, bolsa de pesquisa ser reajustada, Minha Casa Minha Vida, Bolsa Família turbinado e melhor desenhado, porque isso tudo tem um efeito muito forte. Há, evidentemente, uma preocupação econômica porque nós vivemos um cenário internacional desafiador, mas o principal desafio do presidente Lula é o de que ele acerte bem nessa questão, para exatamente consolidar esse nosso projeto de reconstrução do país. Na verdade, de união e reconstrução do país. Na verdade, do ponto de vista interno e externo, essa volta das relações bilaterais, de boas relações exteriores, com esse protagonismo do Brasil. Voltar ao Mercosul, voltar à América Latina, voltar a negociar com todos os continentes de forma igualitária, sem misturar viés ideológico, porque isso acaba prejudicando nosso povo. O povo deve estar em primeiro lugar. A agenda verde é um exemplo disso e de como isso aproxima o Brasil. Não é mais uma questão de cúpula, é algo capilarizado já”, concluiu Fonteles.

Fonte: pensarpiaui.com

Compartilhe