Crise afeta mães e bebês na exterogestação e compromete futuro
Nesta semana, a Folha de S. Paulo divulgou um dado alarmante sobre a primeiríssima infância: o aumento do número de bebês com menos de dois meses de vida matriculados em creche. Em 2022, o número de bebês nessa idade é quase o dobro do registrado no mesmo mês do ano passado. Há casos de bebês com 19 dias.
Esta é a conta da crise econômica, do desemprego e da fome promovidas pelo governo Bolsonaro, que prejudica milhares de famílias e compromete o futuro dessas crianças e bebês.
“A crise faz com que essas mulheres tenham que procurar a creche pública com muito mais antecedência do que procurariam se elas tivessem segurança alimentar, trabalho, emprego e renda”, aponta Luana Bezerra, professora de educação infantil em creche pública, especialista em Primeira Infância.
O desemprego atinge de forma muito mais acentuada as mulheres fazendo com que elas sejam obrigadas a buscar postos precarizados e informais, impedindo o acesso a direitos básicos como licença-maternidade. Esta é a verdadeira ‘escolha difícil’.
Segundo Luana, essa entrada acelerada e precipitada pode trazer prejuízos afetivos e cognitivos para os bebês, principalmente aqueles com menos de três meses. “Eles perdem muito mais do que os bebês maiores, que já andam, porque deveriam estar na construção do vínculo materno. Há um certo amadurecimento que deveria ser respeitado”, explica a professora de educação infantil.
Luana Bezerra faz referência ao período da “exterogestação” ou gestação externa, que compreende os três primeiros meses de vida do bebê, e recomenda-se que ele fique o mais próximo possível da mãe.
No caso da amamentação, a Organização Mundial de Saúde preconiza o aleitamento exclusivo pelo menos até os seis meses de idade, sendo recomendado até os dois anos.
Adoecimento docente e queda na qualidade
As creches públicas, no geral, já trabalhavam no limite por conta da alta demanda. Segundo a educadora, que atua na periferia de Osasco-SP, com o retorno das aulas presenciais, as salas já estão sobrecarregadas.
E, apesar da regulamentação estabelecer um limite de crianças por metro quadrado disponível, já é possível presenciar 38 bebês por sala com apenas 4 a 5 educadoras para dar conta.
“Vai faltar professora para atender essas crianças. Com isso, há o desgaste físico e mental do corpo docente, sem falar na qualidade do atendimento que cai vertiginosamente quando você tem grande quantidade de bebês que exigem alta demanda de atenção, colo e acolhimento”, explica.
O atraso no desenvolvimento infantil
A entrada de bebês com menos de três meses é resultado direto do aumento da pobreza e extrema pobreza no país, que atinge principalmente as mulheres, e deriva para baixa escolaridade, menor relação da família com a escola e até questões de limitação da linguagem.
Estudos apontam que essa situação de vulnerabilidade tem impacto direto no desenvolvimento das crianças. Luana explica que bebês e crianças bem pequenas, quando estão com famílias com menos escolaridade, têm uma perda de cerca de três mil palavras. No entanto, quando a criança está em uma família mais escolarizada, ela tem mais acesso à leitura e à contação de história, a relação da escola com a família funciona melhor.
“Se há família com menos condições de estar na escola, não conseguem ir sequer a uma reunião, porque estão cuidando da questão da sobrevivência, impacta no desenvolvimento desses bebês e crianças. A pobreza vai gerando um problema em escalada de curto, médio e longo prazo”, conclui.
A professora de educação infantil reforça que não há solução para essas questões que não passe pelo poder público e a eleição de um governo que atue para acabar com a extrema pobreza no país. “Se somos realmente responsáveis e preocupados com o futuro das nossas crianças, temos que buscar eleger pessoas comprometidas com a justiça social e a igualdade de gênero”, finaliza.
Ana Clara Ferrari, Agência Todas
Fonte: pt.org.br