Bolsonaro culpa embaixador chinês por atraso na entrega de insumo para vacinas

 Bolsonaro culpa embaixador chinês por atraso na entrega de insumo para vacinas

Quando muitos olhares acusadores se voltarem para você, desvie a atenção apontando o dedo para algum “culpado” de ocasião. A velha tática de malandros de rua, batedores de carteira e vigaristas em geral, recorrente no desgoverno Bolsonaro, agora elegeu o embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, como responsável por mais um dos intermináveis imbróglios bolsonarianos na saga brasileira do combate à pandemia.

Com a manobra diversionista, Bolsonaro e sua entourage tentam camuflar não apenas a inépcia administrativa e estratégica, uma vez que a China é o principal parceiro econômico do Brasil, mas também o rotundo fracasso do alinhamento automático ao ex-presidente norte-americano Donald Trump, que moveu intensa cruzada contra o país asiático na qual Bolsonaro e sua entourage embarcaram irresponsavelmente.

A coluna da jornalista Monica Bergamo na ‘Folha de São Paulo’ desvelou o comportamento, afirmando que o desgoverno Bolsonaro tenta delimitar os recentes desencontros com a China à embaixada em Brasília. Segundo a repórter, o argumento disseminado por ministros é de que Bolsonaro tem bom relacionamento com o presidente chinês Xi Jinping e nada contra a China. Os desentendimentos seriam exclusivamente com o embaixador.

O diplomata é responsabilizado por ter feito postagens duras após o filho do presidente e pretendente a embaixador, deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), criticar a China. Isso é que teria azedado a relação com o presidente. Prosseguindo no raciocínio, Eduardo teria opinião própria irrelevante, já que não fala pelo pai, e deveria ser ignorado. Um bom diplomata teria que saber disso, argumenta o séquito bolsonarista.

“Interlocutores próximos à Embaixada da China dizem que os argumentos de auxiliares do presidente beiram a infantilidade. E que o embaixador Yang Wanming é um quadro chinês de primeira linha, forte e prestigiado em seu país”, afirma a coluna. A repórter lembra que os ataques à China incluem o chanceler Ernesto Araújo e o próprio presidente, que repetidamente ironiza a vacina chinesa Coronavac, que será fabricada pelo Instituto Butantan, de São Paulo.

O Butantã e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) podem produzir, respectivamente, as vacinas Coronavac e de Oxford – as únicas autorizadas até o momento pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para uso emergencial no Brasil – mas dependem de produtos que vêm da China. A demanda do mundo inteiro por esses insumos gerou o temor nos órgãos de que falte o material no Brasil.

Na terça (19), a Fiocruz enviou ofício ao Ministério Público Federal (MPF) informando que a entrega da vacina da Universidade de Oxford desenvolvida com a AstraZeneca vai atrasar de fevereiro para março. Segundo a fundação, o atraso ocorre porque ainda não recebeu o Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) para a fabricação do imunizante. A promessa anterior, feita no final de dezembro, era fornecer o primeiro lote do imunizante por volta de 8 de fevereiro. O insumo está pronto para ser embarcado ao Brasil, mas o governo chinês ainda não liberou o envio.

Também na terça, o cronograma original de vacinação contra a Covid-19 em São Paulo foi suspenso. Com a mudança no cronograma original de vacinação anunciado pelo governador João Doria (PSDB), o estado passará a cumprir o Plano Nacional de Imunização (PNI) do Ministério da Saúde, e não o cronograma anterior.

Doria queria iniciar a vacinação em 25 de janeiro (aniversário da capital paulista), e aplicar duas doses da Coronavac em nove milhões de pessoas até o fim de março. O Butantã, que previa enviar 8,7 milhões de doses ao SUS ainda em janeiro e produzir 46 milhões de doses até abril, por enquanto está parado à espera de uma resolução.

Diplomata se dispôs a buscar soluções

Durante esta semana, multiplicaram-se as intervenções com o objetivo de amenizar a situação, e o próprio embaixador Yang Wanming dispôs-se a ajudar o Brasil a “destravar” a burocracia para o envio dos insumos. É o que afirmou o ministro-general da Saúde, Eduardo Pazuello, nesta quinta (21), em pronunciamento à imprensa. Pazuello ressaltou que conversou com o embaixador na quarta, e este disse que os obstáculos para o envio são burocráticos, e não políticos ou diplomáticos.

A Embaixada da China no Brasil já havia emitido nota na quarta (20) informando sobre a reunião com Pazuello para tratar da cooperação antiepidêmica e de vacinas entre os dois países. “A China continuará unida ao Brasil no combate à pandemia para superarem em conjunto os desafios colocados pela pandemia”, escreveu o perfil da embaixada.

Até o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encontrou-se com o embaixador na quarta, e saiu do encontro fazendo duras críticas ao desgoverno Bolsonaro. “A impressão que dá, com diálogos com quadros da embaixada, é a falta de diálogo do governo brasileiro com a embaixada. É incrível como a questão ideológica com alguns prevalece em relação à importância de salvar vidas”, disparou.

“Isso (os ataques) está no Twitter do filho do presidente (Eduardo Bolsonaro) e do ministro das Relações Exteriores. Esse conflito existe. Tanto que estão me perguntando se o conflito é político ou não. Senão não estávamos falando nisso”, completou Maia.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) propôs que o Congresso Nacional crie uma delegação de parlamentares para conversar com a diplomacia chinesa a fim de negociar a chegada dos insumos. Para ele, Bolsonaro e Pazuello “não têm condições para negociar”.

Na noite de quarta, os presidentes dos partidos de oposição e seus líderes na Câmara dos Deputados encaminharam um ofício à Embaixada da China expressando reconhecimento aos esforços e ao apoio do governo chinês ao povo brasileiro no enfrentamento da Covid-19. No documento, ressaltaram o desenvolvimento e disponibilização da vacina CoronaVac e dos insumos necessários à fabricação tanto da Astrazeneca/Oxford quanto da CoronaVac.

A presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores e deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) também se manifestou publicamente. “ Solidariedade ao embaixador Yang Wanming. Só uma pessoa tosca como Bolsonaro dissocia a @EmbaixadaChina do governo chinês. Desculpa esfarrapada de quem ofende, agride e desrespeita país amigo e agora quer se justificar. Bolsonaro desonra o Brasil”, afirmou em seu perfil no Twitter.

Em nota, o governo federal afirmou que “o Ministério das Relações Exteriores, por meio da Embaixada do Brasil em Pequim, tem mantido negociações com o Governo da China”. A Secom ainda informou que o governo federal é o único interlocutor oficial com o governo chinês. Yang Wanming conversou com os ministros das Comunicações, Fábio Faria, e da Agricultura, Tereza Cristina

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, negou, na quarta, que problemas políticos tenham atrasado o envio dos insumos e das vacinas da China para o Brasil. Segundo parlamentares, Araújo disse que não havia qualquer problema político com o país asiático, mas não deu qualquer prazo sobre a chegada dos insumos chineses.

A China é o maior parceiro comercial do Brasil há uma década. A despeito disso, o ano de 2020 apresentou novos capítulos da difícil relação entre os dois países desde a posse de Bolsonaro, em janeiro de 2019. Entre as inúmeras afrontas, o desgoverno brasileiro, proibiu seus ministros de receber Wanming, e seus membros e filhos do presidente criticam abertamente e reiteradas vezes o país asiático, associando-o ao vírus ou a uma ditadura.

Também emitiram acusações de “espionagem tecnológica” em relação ao 5G. Mas agora Bolsonaro se vê obrigado a abaixar o tom das críticas à chinesa Huawei, fornecedora da tecnologia 5G. O ministro das Comunicações, Fábio Faria, fará em duas semanas uma visita a todos os fornecedores globais de equipamentos – China (Huawei e ZTE), Finlândia (sede da Nokia), Suécia (Ericsson) e Coreia do Sul (Samsung). O próprio Bolsonaro quer telefonar para o presidente chinês, Xi Jinping, para implorar pela exportação de insumos. A ligação já foi pedida ao Itamaraty.

Da Redaçãocom informações de ‘ Folha de S. Paulo

Fonte: pt.org.br

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